domingo, 25 de setembro de 2011

DOMINICANA










                                 DOMINICANA

Depois do desembarque no aeroporto internacional de La Isabele, em Santo Domingo, na República Dominicana, a minha mente é povoada por uma forte lembrança com o perfil de três mulheres: as irmãs Mirabal. Pisar no solo dominicano é como exercitar a memória relativa à história,  à luta e  à  coragem das mulheres latino-americanas que dedicaram suas vidas à conquista da liberdade, a liberdade que ganhou nomes femininos como Patria Mercedes Mirabal, Minerva Argentina Mirabal e Antonia Maria Teresa Mirabal, las mariposas.

Depois de garantir, na loja de câmbio do aeroporto, um maço de pesos dominicanos em troca do dólar, sigo em busca de um táxi. A corrida até o hotel alimenta um pouco mais a minha curiosidade. É uma cidade linda, cartão postal de mar azul e sinuosas ruas por onde um dia se ensaiou a revolução.  Aqui e acolá um outdoor enfatizando algumas políticas de governo, propagandas do mercado de consumo mundial. Torço para ver um outdoor de las mariposas. Até imagino uma frase de impacto: Las mariposas guardam seus sonhos e vigiam a liberdade. Frusto-me a cada acelerada do táxis, que avança no desenho urbano de uma cidade de quadras e mais quadras. Minha busca parece vã. O taxista se esforça para me explicar porque substituíram o nome da avenida Malecón por avenida Presidente George Washington e acrescenta: “dizem que ele foi um bom presidente”. Pigarreio enquanto as palavras do taxista parecem impregnar  o ambiente, que conspira para uma dura realidade. Meus olhos seguem toda a avenida que contorna a beira-mar. Percebo que os hotéis da “constelação” cinco estrelas estão todos por aqui. A observação do taxista me faz voltar de uma ligeira abstração. Ele pensa alto. A avenida Malecón significava um caminho, uma ponte entre a República Dominicana e Cuba. Depois, calou-se, e o silêncio nos acompanhou até o hotel onde já havia confirmado minha reserva.

Na recepção do hotel confirmo a ocupação do quarto e rapidamente pego a minha bagagem. Em algumas horas de voo, sinto-me como se estivesse dentro de uma bola de assoprar, sempre me enfada. No corredor, o som quase inaudível das câmaras instaladas hábil e discretamente. Muita coisa deve passar por esses corredores. Depois de adentrar o quarto, o ambiente acolhedor ajuda-me a relaxar.

Tomo um banho rápido, pois tenho que confirmar minha inscrição no evento. Um encontro de países latino-americanos e ibero-americanos para discutir administração para o desenvolvimento. Depois do credenciamento, retorno para o aconchegante quarto; da janela, observo o entardecer na linha do horizonte, onde se fundem o passado, o presente e o futuro. É novembro em Santo Domingo. O tempo aqui e agora faz-se ponte. Nasci mulher no Brasil de novembro, um ano antes do assassinato de las mariposas. Meus olhos estão sempre marejados. Esse choro é de antes do meu nascer e costumo andar com lencinhos, pois, involuntários, meus olhos marejam pelas lembranças de um tempo sempre presente.

Em 1995, a escritora dominicana Julia Álvarez publicou o livro No Tempo das Borboletas, baseado na vida de las mariposas. Depois veio A festa do Chibo, do peruano Vargas Llosa, que resgata a triste história de uma das ditaduras mais longas e perversas da América Latina: o assassinato das três irmãs Mirabal pelo truculento e depravado ditador Rafael Leónidas Trujillo.

O lusco-fusco em Santo Domingo, nesse fim de tarde novembro, tem feições tristes. O esquecimento de um  tempo e de uma ilha de pessoas, de sonhos e de pesadelos.

Fecho os olhos e visualizo o clamor de militantes dos direitos humanos, dos que combatem a violência contra as mulheres. A injustiça não pode prevalecer. Em assembleia geral das Nações Unidas (1999), foi declarado o dia 26 de novembro como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, em reconhecimento ao sacrifício de las mariposas.
Cinquenta anos depois do assassinato, caminho por entre as ruas de Santo Domingo. Um verniz de democracia ilumina as noites prazerosas de Santo Domingo. A rede hoteleira oferece todos os serviços para a satisfação da clientela: boates e cassinos enormes instalados nos hotéis. Jovens dominicanas, haitianas de rara beleza se confundem com a diversão que só tem hora para começar.

Procuro conciliar os horários das palestras, discussões dos temas, com o horário da minha incursão na cidade, no diálogo com os nativos. Minha curiosidade cresce à medida que os dias vão passando. Não consigo encontrar uma livraria, um sebo sequer. Interrogo o taxista, a recepcionista do hotel sobre indicação de um local na cidade onde possa dispor de livros. Finalmente uma dica de que talvez no shopping recentemente aberto, o melhor entre os demais, eu possa encontrar a livraria.

Enquanto busco a suposta livraria no shopping e penso na juventude dominicana que não dispõe de livros, pergunto-me o que lhe resta? a balada? os cassinos? os serviços? ou ser o próprio serviço?

Arrumo as malas e parto de Santo Domingo, enquanto uma sensação de impunidade me acompanha. Os crimes recentes estão escondidos nas prateleiras de um sistema que “tratora” gente, sonhos e esperanças. Parto sem levar nenhuma obra escrita ou desenhada por essa gente que me comove. O shopping é do modelo “mais mercadoria do mundo”, ou seja, nada de livros.

Alguns meses depois, já no Brasil, acompanho uma barbaridade denunciada pelos órgãos internacionais de direitos humanos: uma professora disputava a direção de uma escola pública em Santo Domingo com mais dois professores; a professora, por encontrar-se em vantagem na disputa, foi assassinada pelos seus adversários. 

Meus olhos continuam a marejar e, na grossa lágrima que escorre sobre a minha face, escuto o som do último gemido acompanhado do sorriso corajoso de uma jovem dominicana.

Íris Tavares
Santo Domingo, RD.  Novembro de 2010.
 
Este texto foi extraído do "DUP e Direitos Humanos e Outras Expedições"  
Edições Acauã. 
Cajazeiras-PB. 2011.

domingo, 11 de setembro de 2011

POEMA - DASDÔ



DASDÔ

Na antiga rua do Sovaco
Mora Dasdô
Numa casa simples
Janelas altas e de portas gigantescas
       (herança da família)
Antes estudava, sonhava ser professora
Hoje casada, diverte-se vendendo imagens.
Seis filhos à sua saia
E o marido é carpinteiro
       (antigo vizinho seu)

A tinha como mana
mas o tempo esqueceu
mesmo assim ao meio dia
na agonia do ir pra casa
de longe reparei naquela banca
olhar límpido, sorriso debulhado
e a felicidade criança
daquela que um dia
compartilhou de minhas esperanças

Permanece intacta
 f e l i z
como se nunca tivesse saído
da antiga rua do sovaco.

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
 Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - SEM FOME




SEM FOME

Não queria comer
Que não lhe lembrassem
do trabalho

Horas de beber...
Mil vezes se sentira tentada
Mulher que pode
O que não deve
O resto! Bagatelas.

O jeito foi sentar
esfriar as ideias.

Deitada no beliche inferior
fita o que lhe está por cima
        e s t r a d o
algumas tábuas
úmidas e fétidas
do mijo da madrugada.

Sua filha continua
se molhando durante a noite.

Não quer saber.
  Mãe vai comer.
Sem fome  estômago esfria.
Olhos amolecidos
soneira do meio dia

Encabulada a tarde chega
mansa, desfolhada

Filha ajuda mãe se organizar
Bolsa à mão
Sempre saindo
Camisão

Sonhos...
Borboletas azuis
Aguardam quietas
O retorno ao lar.

Poema extraído de” Santos de Quarentena”/Iris Tavares
Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - POÉTICA À OPERÁRIA


POÉTICA  À  OPERÁRIA

Faltou o beijo
na hora da chegada
línguas derramadas
antes que a porta se abra
um beijo e mais nada.

Conversas atropeladas
sobejos matinais
tempestade em copo d'água
sem que seja pedido
um beijo nunca é demais

Essa mulher que se emburrece
                   à toa
porque lhe foge a poesia
             é operária
tem a vida por um fio
bico de passarinho
rendas na braguilha

Mulher que chega do trabalho
tem suas rabujes, descrença,
predestinada a ser doméstica
avental aos pés da cama
quase tudo em nome dessa fulana
                um beijo
                um sorriso
                se não a boca carrapicho!

Que se dane essa azia
se queime essa agonia
suspenda a conta
não pague a padaria
precisa-se de fermento
em lugar da seda
               do colar
               dos brincos
               dos cristais

Lábios apertados
coração beira mundo
um pedido quase em prece
com fervor...

Um beijo
Um aperto
Um suspiro e seus ais...

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
 Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - CONFISSÃO


CONFISSÃO

Não houve tempo
entrelaçar as mãos
começo de manhã
fantasias vãs
Mulher vadia
afoga-se na panela
entre batatas e verduras
carne frita

Não queria esse papo
política, carestia,
mas o açougueiro é bravo
corpo respingado, sangria
Diz-se boi
a reclamar do curral
e não tem aparência de noivo,
'homem enamorado'

Não queria esse papo
intriga da sociedade
seus babados
o homem da carne que me perdoe
votar sem criatividade
é mal estar por longos anos
servidão

Insisto! Não queria esse papo
Filhos meus: por que esse atraso?
Que volte a madrugada
o dia se chegue mais terno, apaixonado
Lá fora é pasto
      Preciso sair do ninho?
Bicos emendados, cantos entoados
que me chegue assim a vida
Só os dias – alimentar o gado
'never'

Venha a relva e não o pasto
filhos meus, dos outros
e do mundo.

Poema extraído de “ Santos de Quarentena”/Iris Tavares, 
Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - ALERTA




ALERTA

É preciso que haja
mais meiguice
mais compreensão
mais emoção

É preciso que haja
mais natureza
Coração sem medo
de guerrilhar
e conquistar
o que de direito
nos pertence.

É preciso que haja
humildade e consciência
nos jovens
nos velhos
nas crianças
nos amantes
Flores nos ideais.

É preciso que haja
mais mulheres na luta
no amor
na entrega
não somente a do corpo
a cabeça é que conta

Chega de arestas
frases incompletas
'Mulheres, precisamos conspirar'!
Por um país
feito de homens
fardões e camisolas
milhares de 'fulanas'
operários
sabichonas

Mulheres, precisamos acordar!!!

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
Fortaleza, Expressão, 1992.

GUERRA INFINITA CONTRA A HUMANIDADE



 GUERRA INFINITA CONTRA A HUMANIDADE

Em meio a todos os esforços para a aclamação de “heróis anônimos” e comoção mundial, o documentário “Alerta Geral” exibido ontem à noite, no programa "Fantástico", da Rede Globo, deu-me duas certezas: que os norte-americanos não aprenderam nada com aquele lamentável fato e pouco tempo depois provaram existir um espírito bélico no seio de sua sociedade e que o governo deles não é nem um pouco solidário com seus cidadãos, só repetiu o que outros já haviam feito: guerra.
Após os atentados de 11 de setembro, mesmo comovidos e estupefatos com a perda de milhares de vidas, a maioria dos cidadãos norte-americanos exigiram de seu governo retaliação, que o inimigo fosse descoberto e destruído, deixando claro que o exemplo de uma cultura de paz que os japoneses deram ao mundo após os ataques nucleares de Hiroshima e Nagazaki, desferidos por eles, norte-americanos, durante a 2ª Guerra Mundial, quando sentenciaram o desarmamento de seus exércitos, não foi sequer cogitado.
Porém, esse mesmo governo, que atendeu prontamente os clamores de retaliação de seus cidadãos, lhes deu as costas pouco tempo depois, ao assistir, imóvel, os banqueiros de Wall Street desferirem sobre a economia norte-americana e, consequentemente, as poupanças, hipotecas e empregos de milhares de cidadãos daquele país e do mundo inteiro o maior ataque especulativo da história mundial.
O cineasta Charles Ferguson, dirtor de “Trabalho Interno” e o professor Aristóteles Berino da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, autor do livro “A economia política da diferença”, nos ajudam a responder duas perguntas cruciais: por que, ao invés de conter esses ataques, o governo norte-americano disponibilizou empréstimos com o dinheiro dos mesmos cidadãos que estavam sendo despejados de suas casas e demitidos de seus empregos? Afinal, quem declarou guerra contra os norte-americanos e, no limite, contra a humanidade?
O professor Berino, nos responde: o capitalismo, de uma forma aberta e clara, declarou “guerra infinita contra a humanidade”; sobretudo porque se transformou em um sistema social tão agudo na sua hegemonia que penetrou as estranhas de governos e de culturas, promovendo conflitos insolúveis: comunidades tradicionais X cultura industrial; progresso energético X preservação ambiental, por exemplo. “Por isso foi tão comum na última década, e assim permanece, a percepção de que a miséria globalizada, a violência sob a forma da guerra e também aquela que é distribuída no interior das sociedades, bem como a intolerância e a barbárie mundiais, são o resultado inelutável das oposições Norte e Sul, Ocidente rico X o resto do mundo e, mais recentemente, ‘mundo civilizado’ X ‘fundamentalismo religioso’ ou ‘choque de civilizações’. Guerra infinita porque as polarizações, na verdade, apenas disfarçam a dispersão do inimigo, que se aglutina em redes e nas identificações que produz em todo mundo. É a guerra oportuna da era das identidades irascíveis e incontornáveis”.
Ao deflagrar “Guerra ao terror”, como reação ao 11 de setembro de 2001, e conceder empréstimos, como solução a crise de 2008, o governo norte-americano deixa claro que não concorda nem com Ferguson, nem com Berino, mas eu concordo. Nosso inimigo, o mais mortal de todos, é o capitalismo.
 
Por
Tanísio Vieira
Mestre em História/PUC/SP 
Assessor de Planejamento IMPARH/PMF.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

7 SETEMBRO - INDEPENDÊNCIA DO BRASIL



"A Independência do Brasil" (de Pedro Américo)
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Hoje (7 de setembro) nosso país completa 189 anos de independência, sob os holofotes da midia mundial: este é o 5º ano da nossa "Década de Ouro", iniciada em 2007 (com os XV Jogos Pan-Americanos, no RJ). O Brasil ainda sediou os Jogos Mundiais Militares de 2011 (RJ) e, segunda-feira. dia 12 de setembro, sediará o 60º Concurso Miss Universo (em SP). Ainda seremos anfitriões da Copa das Confederações (2013), da Copa do Mundo de Futebol (2014) e das Olimpíadas de 2016 (RJ). Este é um dos raros momentos nos quais a atenção do mundo converge para um único local. Não é de se estranhar: somos uma nação emergente, democrática, politicamente estável e o líder inquestionável do Hemisfério Sul. A economia está em crescimento, o desemprego é mínimo e ainda não fomos atingidos pela crise que se abate sobre o dito "mundo desenvolvido". Temos motivos para ter a nossa auto-estima elevada, uma vez que ainda somos o 5ª maior e mais populoso país do globo terrestre e a 6ª economia do planeta. Um Estado laico, multi-racial e poli-religioso. Por tudo isso, feliz aniversário, Brasil! Parabéns, brasileiros! Não somos mais o "país do futuro"! Crescemos e amadurecemos: somos a grande nação do século XXI, a potência do presente!

Por: Heitor Miranda
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Saiba mais: http://escolakids.uol.com.br/public/upload/file/independencia%20do%20Brasil2.jpg