quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

FELIZ ANO NOVO!


É TEMPO DE AGRADECER

Final de ano é um tempo de reflexão e expectativa ensaiadas. É um tempo de agradecer, principalmente quando se encerra uma caminhada em que houve desafios permanentes. 

Na verdade, o fim de ano é o começo de mais um ano, que, para ser novo, depende da nossa capacidade de transformar as perdas em ganhos e continuar acreditando que a transformação é um processo que se inicia de acordo com a natureza de cada um. Há sempre um hiato entre aquilo que é e aquilo que vem a ser, entre o que se quer e o que se pode fazer. É um tempo que foi extraído do cotidiano dos operários, dos favelados, dos espigões onde a elite se põe vigilante e decreta feriado para solenizar o último dia do ano.

O último dia do ano é um incentivo para recuperar o que passou despercebido, é um estalar de dedos que desperta as grandes ideias e abre sorrisos de boas-vindas para um tempo que comunga com um mundo, que vai além das coisas,  o mundo das pessoas.

Por isso eu agradeço por esse momento e pelo que ele representa nas histórias individual e coletiva de cada uma das pessoas que se permite aprender, interagir e vivenciar a grande aventura: tornar-se um ser humano melhor.

Que o janeiro de 2012 marque, na vida das pessoas, uma etapa de realizações e conquistas e a durabilidade de um sonho que faz de nós idealizadores e lutadores de um novo tempo.  
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Maria ÍRIS TAVARES Farias
Presidente
Instituto Municipal de Pesquisa, Administração e Recursos Humanos de Fortaleza-IMPARH.
Av. João Pessoa, 5609. Bairro Damas.Fortaleza-Ce.CEP 60.425.682

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

NÃO NOS PERDOARÃO (POESIA)


NÃO NOS PERDOARÃO

Não nos perdoarão por entoarmos hinos
E lavar com orgulho e altivez
Os corpos sacrificados dos nossos mortos

Não nos perdoarão por continuarmos sonhando
Sem assinalarmos nenhum pacto, nenhum acordo
Fomos constituídos sem redomas

Não nos perdoarão
Pelo nosso divórcio do bom gosto
Dos bons modos

Comum em nós chama-se indignação
Defendemos liberdade
Abominamos inutilidades

Passa-passa gavião
Todo mundo passa-passa

Não nos perdoarão
Por desprezarmos a passividade
Por reivindicarmos florestas
Em vez de jardins privados

Vigília, forquilha, democracia.
Passa-passa gavião
Todo mundo passa-passa

A vergonha de Rui
Pode ruir, fazer rir
Tenta o povo esmilinguir

Dentro e fora de barricada
República fracassada
por falsos sentimentos tupiniquins

Não nos perdoarão
Pelos manifestos, protestos,
Desafetos atores da luta de classe

Os nobres barões do concreto
Os neocoronéis de gravata
Botas asfaltadas

Lacaios do sistema financeiro
Não nos perdoarão
Por continuarmos sonhando.
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Extraído do livro: "À sombra dos quintais." 
de: Iris Tavares
Fortaleza, Novembro, 2008.

sábado, 3 de dezembro de 2011

"LIBERDADE DE IMPRENSA NÃO PODE SER CONFUNDIDA COM LIBERALISMO"

 
Luiz Gustavo Pacete - Portal Imprensa
Polêmico e criticado por correntes políticas opostas ao "Movimento de Blogueiros" ou também conhecido como "Blogueiros Progressistas", o jornalista Alberto Perdigão ganhou corpo e visibilidade quando passou a defender, publicamente, a candidatura da presidente Dilma Rousseff, em 2010. O grupo alegava que a candidata teria sido vítima de inverdades e manipulações por uma parte da imprensa, que, declaradamente, apoiava o então candidato José Serra.
Independente do termo ou da linha ideológica atribuída ao grupo, o foco do jornalista, que também é pesquisador de comunicação e mídia digitais, é discutir a comunicação pública. Atualmente, ele é um dos articuladores do movimento em Fortaleza (CE) e defensor da teoria da Comunicação Pública, que, segundo ele, é uma comunicação que vai do lado oposto ao que se entende atualmente por 'público'. "Uma comunicação pública ideal só será efetiva quando estiver nas mãos do povo e não for representada por formatos institucionalizados". Perdigão também é é autor do livro "Comunicação Pública e TV Digital", uma pesquisa sobre a TV pública no advento das mídias digitais. Em entrevista à IMPRENSA, Perdigão fala sobre o conceito de comunicação pública, o papel das emissoras públicas e sobre o "Movimento Blogueiro" no país. Além de criticar a falta de entendimento por parte dos empresários de radiodifusão, com relação ao Marco Regulatório da Mídia. 
 .
Qual a correta definição de comunicação pública?
A discussão sobre a comunicação pública ainda é um tema muito novo nos governos municipais, estaduais e até mesmo no Federal. A própria academia ainda vê o assunto como novidade. Mas o que preocupa é que a sociedade está distante de se apropriar das práticas relacionadas à comunicação pública.
O que exatamente é esse conceito?
É um novo parâmetro que surge para sepultar de vez o formato de comunicação institucional instituído por governos militares, que os Estados Unidos propuseram para a América Latina na década de 1960. Esse movimento de comunicação pública prima por uma comunicação dialógica entre os poderes públicos e o cidadão.
As emissoras públicas de TV se enquadram neste modelo?
Tevês, como a Fundação Padre Anchieta, mesmo com seus altos e baixos, e a própria TV Brasil, são experiências importantes. Vejo que precisam evoluir, mas representam a saída da inércia. O que em minha opinião é condenável e perigoso é que a TV Brasil tente estabelecer uma rede com as outras emissoras públicas estaduais sem se preocupar em exigir que elas criem conselhos curadores. Eu não vejo sentido no fato de o Governo Federal se preocupar em oferecer programação para televisões estatais onde uma meia dúzia de políticos e o governador local ficam mandando.
Mas esse mundo ideal está próximo de tornar-se realidade?
Ainda não, é algo que não está em debate. Quero conversar com o Nelson Breve (atual presidente da Empresa Brasil de Comunicação) para dizer isso a ele, mesmo que eu seja o primeiro.
Explique melhor o papel da TV pública neste conceito. Não existe certa confusão de termos?
A TV pública no Brasil ainda é algo a ser construído... Acredito que é possível que nossa TV pública construa um projeto político, mas isso leva tempo. O importante é que já saímos da inércia. Várias coisas precisam ser pensadas, um projeto de financiamento... A EBC, por exemplo, acaba sendo contaminada em relação à expectativa do governo pelo fato de receber verba pública. Isso pode continuar assim? Talvez. Mas é possível que existam outras maneiras? Não sei. Uma cobrança de taxa na compra de televisores, como se faz na Inglaterra, ou outras maneiras de financiamento... Outra questão é a tecnologia, não só da EBC, mas de toda a rede que ela estabeleça no país. Muitas vezes, você moderniza uma emissora que regionalmente continua vivendo sobre contaminação política. Enquanto esses projetos não forem reconstruídos, nossa TV continua a ser desinteressante.
As redes sociais representam um marco nessa comunicação pública que você defende?
Ela caminha juntamente; é complementar. Por que a cultura digital é horizontal e destrói por completo as velhas formas de comunicação. Ela promove a circulação do poder. O que esses fenômenos trazem de novo é que a informação circula; com isso, o poder circula e é este o anseio da sociedade atual.
Qual seria o papel do governo nesse movimento?
É muito bom que esse movimento comece pelo Governo Federal. Ele pode servir de inspiração para que estados e municípios façam o mesmo. Mas a comunicação pública só vai existir efetivamente quando o público se apoderar dela. É necessário que todos se mobilizem; também é muito importante que exista um movimento de baixo para cima.
Está acontecendo na velocidade necessária?
Está muito atrasado. Essa mobilização é lenta porque hoje quem está com o poder não quer entregá-lo ao povo de forma efetiva. Os poderosos sabem que quando o poder entra em uma roldana de comunicação pública, a informação vai ser compartilhada.
Mas, justamente pelo fato de ter medo de ficar descoberto, o governo não dificultaria a democratização da comunicação?
Me preocupa se não vamos conseguir avançar nessa discussão. O governo da Dilma e do Paulo Bernardo (Ministro das Comunicações) me parece tímido em relação a um projeto de comunicação efetivo.
Você quer dizer regulação?
Sim. No momento em que o governo não assume seu papel de protagonista em relação ao novo marco regulatório, não avançaremos. Acho um equívoco o governo não se pronunciar claramente sobre esse assunto. Ele é dúbio neste aspecto e não está contribuindo em nada com o debate. Ele deveria assumir a posição que lhe cabe e dizer à sociedade de forma clara o que ele pensa.
A sociedade brasileira tem dificuldade em entender o conceito de regulação da mídia?
Eu sempre faço uma comparação com a Argentina. Lá, o governo sentou com as partes interessadas e chegou a um consenso. Não fizeram a melhor do mundo, mas fizeram a lei que era possível. Equador avançou, Venezuela avançou. E nós?
Mas são contextos diferentes do Brasil. Você quer dizer que concorda com a posição desses governos em relação à imprensa?
A comparação que eu faço não é com o conteúdo dessas leis e sim com a atitude do governo de ter feito algo.
Não lhe parece que essa discussão está carregada de ideologia?
Eu acho que as empresas confundem liberalismo com liberdade. O liberalismo no Brasil está resguardado, as empresas todas vão continuar atuando e fazendo dinheiro. Os empresários de radiodifusão poderão fazer fortuna. Mas a liberdade de empresa não pode ser confundida com a liberdade de imprensa. A liberdade de imprensa tem uma função social e tem que ser muito maior do que a questão econômica. Eu acho muito maldoso misturar regulação com censura.
Você é um dos articuladores do chamado "Movimento dos Blogueiros" ou "Blogueiros Progressistas". Acredita que o grupo está disposto a discutir questões importantes para o país ou quer exercer um papel político partidário defendo um governo ou outro?
A eleição da Dilma foi um marco fundamental para o "Movimento de Blogueiros". Os meios de comunicação, de maneira em geral, fizeram uma opção pelo Serra e esse grupo surgiu para desmentir mentiras e distorções publicadas pela mídia à época da eleição. Com isso, surgiu uma rede de contra-informação ou contrapoder. O movimento não tem uma intenção partidária ou eleitoral e nem CNPJ, ele tem, apenas, uma identidade política que é virtual e colaborativa. Se somos chamados de progressistas ou não, pouco importa. O que importa é que não vamos abandonar a luta. 
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Alberto Perdigão, jornalista, editor do Blog da Dilma em Fortaleza e um dos organizadores do II WebFor - Comunicadores Digitais do Nordeste - dias 14 e 15 de abril de 2012.
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Extraído de: http://dilma13.blogspot.com/2011/11/liberdade-de-imprensa-nao-pode-ser.html

terça-feira, 15 de novembro de 2011

UMA PONTE PARA MOSCOU

UMA PONTE PARA MOSCOU

Nessa tarde de sexta-feira, aguardo a visita de Valentin e a minha expectativa é grande. Valentin é natural de uma província russa, mais precisamente da Sibéria, filho de uma jovem comunista judia julgada e condenada ao campo de concentração na Sibéria por aqueles que representavam o alinhamento mais perverso da cortina de ferro. Ali a sua mãe conhecera seu pai, e desse encontro e convivência nascera Valentin, na vastidão rigorosa de uma região onde, de três em três meses, a noite cai sobre a natureza. Quando tem dia, este não passa de um lampejo de claridade cinza, acompanhado dos braços gelados que tudo abarcam.  Seus pais deram-lhe nome apropriado, pois sua teimosia, persistência e resistência o tornam sobrevivente de uma história de muito amor e esperança, tempos de muitas dificuldades; aos seis anos de idade, Valentin, na condição de órfão, é obrigado a olhar para o mundo como um ser fruto de um amor banido da felicidade; por outro lado, é forjado de uma esperança indestrutível.

O anúncio veio da ante-sala. O professor Valentin acaba de chegar, acompanhado de uma amiga em comum e de sua intérprete. Cumprimento-o curiosa. Sei quase nada da língua russa, mas a expressão do prof. Valentin o faz comunicar-se pelos olhos. A tradutora se insere de forma magistral ao traduzir o que o professor tão determinadamente inicia a dizer. É um momento mágico porque o pedaço da Rússia que eu aprendi a enxergar estava ali na minha frente. Pelos olhos de Valentin, viajo para a Sibéria, Moscou. Penso no que a história pode fazer com as pessoas ou no que podem fazer das suas vidas. Sinto-me passarinho naquela primavera vermelha, naquele outono de folhas caídas sobre as calçadas por onde marcha uma revolução permanente entre os povos, a cultura, a solidariedade, a dignidade. Tenho dificuldade de tirar meus olhos dos olhos de Valentin. Ele gesticula, tem tom de voz emocionado e me diz que só o amor pode salvar o mundo. O que seria de mim sem esse sentimento de amor? Os olhos dele o expressam. Não importa o lugar, o tempo, os governos, o sistema, porque o amor tem sua própria lógica, tem a dimensão do todo. Pela luz de seus olhos, vi um tempo de guerra que ameaça engolir os mais pobres de espírito. Declara: “Eu não estou aqui para pedir nada, tenho tudo que preciso”.

Na lista dos maiores poetas do mundo comungamos da mesma paixão pelo poeta chileno Pablo Neruda e pelo poeta russo Maiakóvsk: "Sem forma revolucionária não há arte revolucionária" . Uma mesa de trabalho e o seu tablado em fórmica nos colocam um frente ao outro. Esclarece-me a sua intenção de ser artesão do teatro: fazer com as mãos do coração. Teatro é aquilo que toca a gente e é capaz de transformar; se não for isso, não é teatro.

Conta-me sobre sua determinação em tempo de pouca abertura, sobre sua contribuição assídua para uma associação chilena com a responsabilidade de cuidar da luta e do movimento político da esquerda no Chile. As doações dialogavam com o sonho de Valentin de um dia poder visitar o Chile e caminhar no solo que Neruda, com paixão ardorosa, semeava para toda a América Latina. Em 1997, plantou seus pés no solo chileno. Uma comunista chilena foi sua companhia numa tarde azul em visita a Isla Negra. Um pedido seu o fez estar só para chorar copiosamente a memória daquele que, em vida, não pôde abraçar, mas a sua poesia o acompanhou em momentos de pura lucidez em que o amor mostrava sua força e a sua humanidade. Caminhou nos aposentos do poeta como uma borboleta em manhãs de outono, à brisa de um planeta de mulheres e homens em busca da felicidade e da paz. Estar no ambiente, nas coisas em que o poeta da esperança deixara impressões de uma luta para ser alimentada, cuidada pelo amor e pela coragem dos que se veem libertados causa-lhe muita emoção. Um detalhe naquela casa o trouxe mais próximo ao poeta. O banheiro de Neruda é uma galeria de arte que se conserva através dos anos. Do teto ao piso, a parede segura imagens de mulheres nuas, vertiginosamente sensuais, em poses de fazer delirar os homens de paixões acesas. Por entre os lábios, Valentin deixa escapar: “Passei a compreender melhor o poeta”.

A tarde esvai-se como um bando de pássaros em revoada, em degredo, para os recantos mais escondidos. Penso: somos como os pássaros, sempre na ilusão de uma suposta liberdade. E a liberdade eu vi nos olhos de Valentin. Ele a trouxe de tão longe e enebriou meu coração, minha saliva adocicada de frutas sazonais próprias dos trópicos.

A tradutora chama-lhe a atenção para o horário da oficina. Recebo de Valentin um guia turístico de Moscou, um chocolate russo, uma caneta em estilo artesanal. Toco naqueles objetos com profundo respeito, porque sei do esforço de tantos para que eles, os objetos, pudessem chegar a mim. Com a caneta em artesania russa, dedico dois livros a Valentin.

 Depois um abraço de duas almas que creem no amor com a mesma força e que se veem refletidas, uma nas claras águas do Atlântico quando se junta ao rio Ceará, e a outra na correnteza  do rio Amur (Oblast de Amur). Afinal, o mar é um só, e todas as águas correm para lá. Da janela do escritório, vejo o vulto de Valentin, que abre seus longos braços num gesto de generosidade plena a projetar-se na nossa tímida calçada da praça do ser.

Por
Íris Tavares
Fortaleza (CE), agosto de 2011.

domingo, 23 de outubro de 2011

ELEGIAS A CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


XLIII

O amor é urgente
A cama é urgente
O beijo é urgente
E o gesto ausente
é saudade.

Extraído do livro O Domador do Verbo. Elegias a Carlos Drummond de Andrade de autoria de Íris Tavares. Expressão Gráfica Editora,1994. Fortaleza-CE.


XLIV

Há nos corpos
essa nudez desbragada
esse impudico pudor
que ficou lá fora
atrás da porta
esperando...
Quem sabe?

Extraído do livro O Domador do Verbo. Elegias a Carlos Drummond de Andrade de autoria de Íris Tavares. Expressão Gráfica Editora,1994. Fortaleza-CE.


XLV

Cai a noite
em olhos distantes
em boca que vi
balbuciar o gozo
o gemido
o grito
o infinito

Cai a noite
em peles romãs
filosofias vãs
na impressão corpórea
que esse momento reluz

Cai a noite
traduz-se o verbo
que é carne
corpo são

E o gemido desses velhos
e  novos interiores.
Somos como todos: eruditos      
e nos extasiamos no gozo
enquanto cai a noite.

 LIX

Bendigo esse sol
vapores de alcova
em manhãs de verão
lento beijo no teu corpo

sol de janeiros, fevereiros
marco de março
a estreitar nossos olhos
(quarto distante dos meus passos)
vassalos, cantos de galos...

Imagem de brilho
e flores cravadas em nossos sexos
brincamos peito em aberto
mar tangido das serras, dos seixos

Derrama-se sobre ti
água de poros, vértice da língua
que transita no meu céu
onde espuma essa paixão

Sol da manhã
deita-se à nossa cama
enrosca-nos, contorce-nos
corpo à boca
boca no corpo
tição somos

Pela janela nos atiramos
                    nenhum andar -
como anjos rebeldes que somos
voamos rumo ao sol

Janela aberta
luz do sol
o teu corpo no meu corpo
é festa !!!

Extraído do livro O Domador do Verbo. Elegias a Carlos Drummond de Andrade de autoria de Íris Tavares. Expressão Gráfica Editora,1994. Fortaleza-CE.

TEMPO BOI

João do Brasil
Brasil do cão
Brasil de todo estrangeiro!

Brasil de Nsa. Sra. de Aparecida
que nunca foi suicida
e que urgentemente
precisa nos ajudar

Brasil nosso de cada dia
agonia, vilania
e a febre que nos consome

O que fazer?
Procuremos de avenida
em avenida
retomemos Farropilha
Caldeitão
Farrapos
Insurreição
Balaiada

e nos campos do Senhor
altar de Canudos

Nem de longe
nem de perto – temos tudo, tanto e nada!
Com tantos inventos
rincões!!!

Com Deus que nos deu o seu pulmão
                    a  Amazônia - 
E nada nos custa
nem mesmo a nossa apagada
consciência de brasileiros!!!

Quando será?

Extraído do livro O Domador do Verbo. Elegias a Carlos Drummond de Andrade de autoria de Íris Tavares. Expressão Gráfica Editora,1994. Fortaleza-CE.

domingo, 25 de setembro de 2011

DOMINICANA










                                 DOMINICANA

Depois do desembarque no aeroporto internacional de La Isabele, em Santo Domingo, na República Dominicana, a minha mente é povoada por uma forte lembrança com o perfil de três mulheres: as irmãs Mirabal. Pisar no solo dominicano é como exercitar a memória relativa à história,  à luta e  à  coragem das mulheres latino-americanas que dedicaram suas vidas à conquista da liberdade, a liberdade que ganhou nomes femininos como Patria Mercedes Mirabal, Minerva Argentina Mirabal e Antonia Maria Teresa Mirabal, las mariposas.

Depois de garantir, na loja de câmbio do aeroporto, um maço de pesos dominicanos em troca do dólar, sigo em busca de um táxi. A corrida até o hotel alimenta um pouco mais a minha curiosidade. É uma cidade linda, cartão postal de mar azul e sinuosas ruas por onde um dia se ensaiou a revolução.  Aqui e acolá um outdoor enfatizando algumas políticas de governo, propagandas do mercado de consumo mundial. Torço para ver um outdoor de las mariposas. Até imagino uma frase de impacto: Las mariposas guardam seus sonhos e vigiam a liberdade. Frusto-me a cada acelerada do táxis, que avança no desenho urbano de uma cidade de quadras e mais quadras. Minha busca parece vã. O taxista se esforça para me explicar porque substituíram o nome da avenida Malecón por avenida Presidente George Washington e acrescenta: “dizem que ele foi um bom presidente”. Pigarreio enquanto as palavras do taxista parecem impregnar  o ambiente, que conspira para uma dura realidade. Meus olhos seguem toda a avenida que contorna a beira-mar. Percebo que os hotéis da “constelação” cinco estrelas estão todos por aqui. A observação do taxista me faz voltar de uma ligeira abstração. Ele pensa alto. A avenida Malecón significava um caminho, uma ponte entre a República Dominicana e Cuba. Depois, calou-se, e o silêncio nos acompanhou até o hotel onde já havia confirmado minha reserva.

Na recepção do hotel confirmo a ocupação do quarto e rapidamente pego a minha bagagem. Em algumas horas de voo, sinto-me como se estivesse dentro de uma bola de assoprar, sempre me enfada. No corredor, o som quase inaudível das câmaras instaladas hábil e discretamente. Muita coisa deve passar por esses corredores. Depois de adentrar o quarto, o ambiente acolhedor ajuda-me a relaxar.

Tomo um banho rápido, pois tenho que confirmar minha inscrição no evento. Um encontro de países latino-americanos e ibero-americanos para discutir administração para o desenvolvimento. Depois do credenciamento, retorno para o aconchegante quarto; da janela, observo o entardecer na linha do horizonte, onde se fundem o passado, o presente e o futuro. É novembro em Santo Domingo. O tempo aqui e agora faz-se ponte. Nasci mulher no Brasil de novembro, um ano antes do assassinato de las mariposas. Meus olhos estão sempre marejados. Esse choro é de antes do meu nascer e costumo andar com lencinhos, pois, involuntários, meus olhos marejam pelas lembranças de um tempo sempre presente.

Em 1995, a escritora dominicana Julia Álvarez publicou o livro No Tempo das Borboletas, baseado na vida de las mariposas. Depois veio A festa do Chibo, do peruano Vargas Llosa, que resgata a triste história de uma das ditaduras mais longas e perversas da América Latina: o assassinato das três irmãs Mirabal pelo truculento e depravado ditador Rafael Leónidas Trujillo.

O lusco-fusco em Santo Domingo, nesse fim de tarde novembro, tem feições tristes. O esquecimento de um  tempo e de uma ilha de pessoas, de sonhos e de pesadelos.

Fecho os olhos e visualizo o clamor de militantes dos direitos humanos, dos que combatem a violência contra as mulheres. A injustiça não pode prevalecer. Em assembleia geral das Nações Unidas (1999), foi declarado o dia 26 de novembro como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, em reconhecimento ao sacrifício de las mariposas.
Cinquenta anos depois do assassinato, caminho por entre as ruas de Santo Domingo. Um verniz de democracia ilumina as noites prazerosas de Santo Domingo. A rede hoteleira oferece todos os serviços para a satisfação da clientela: boates e cassinos enormes instalados nos hotéis. Jovens dominicanas, haitianas de rara beleza se confundem com a diversão que só tem hora para começar.

Procuro conciliar os horários das palestras, discussões dos temas, com o horário da minha incursão na cidade, no diálogo com os nativos. Minha curiosidade cresce à medida que os dias vão passando. Não consigo encontrar uma livraria, um sebo sequer. Interrogo o taxista, a recepcionista do hotel sobre indicação de um local na cidade onde possa dispor de livros. Finalmente uma dica de que talvez no shopping recentemente aberto, o melhor entre os demais, eu possa encontrar a livraria.

Enquanto busco a suposta livraria no shopping e penso na juventude dominicana que não dispõe de livros, pergunto-me o que lhe resta? a balada? os cassinos? os serviços? ou ser o próprio serviço?

Arrumo as malas e parto de Santo Domingo, enquanto uma sensação de impunidade me acompanha. Os crimes recentes estão escondidos nas prateleiras de um sistema que “tratora” gente, sonhos e esperanças. Parto sem levar nenhuma obra escrita ou desenhada por essa gente que me comove. O shopping é do modelo “mais mercadoria do mundo”, ou seja, nada de livros.

Alguns meses depois, já no Brasil, acompanho uma barbaridade denunciada pelos órgãos internacionais de direitos humanos: uma professora disputava a direção de uma escola pública em Santo Domingo com mais dois professores; a professora, por encontrar-se em vantagem na disputa, foi assassinada pelos seus adversários. 

Meus olhos continuam a marejar e, na grossa lágrima que escorre sobre a minha face, escuto o som do último gemido acompanhado do sorriso corajoso de uma jovem dominicana.

Íris Tavares
Santo Domingo, RD.  Novembro de 2010.
 
Este texto foi extraído do "DUP e Direitos Humanos e Outras Expedições"  
Edições Acauã. 
Cajazeiras-PB. 2011.

domingo, 11 de setembro de 2011

POEMA - DASDÔ



DASDÔ

Na antiga rua do Sovaco
Mora Dasdô
Numa casa simples
Janelas altas e de portas gigantescas
       (herança da família)
Antes estudava, sonhava ser professora
Hoje casada, diverte-se vendendo imagens.
Seis filhos à sua saia
E o marido é carpinteiro
       (antigo vizinho seu)

A tinha como mana
mas o tempo esqueceu
mesmo assim ao meio dia
na agonia do ir pra casa
de longe reparei naquela banca
olhar límpido, sorriso debulhado
e a felicidade criança
daquela que um dia
compartilhou de minhas esperanças

Permanece intacta
 f e l i z
como se nunca tivesse saído
da antiga rua do sovaco.

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
 Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - SEM FOME




SEM FOME

Não queria comer
Que não lhe lembrassem
do trabalho

Horas de beber...
Mil vezes se sentira tentada
Mulher que pode
O que não deve
O resto! Bagatelas.

O jeito foi sentar
esfriar as ideias.

Deitada no beliche inferior
fita o que lhe está por cima
        e s t r a d o
algumas tábuas
úmidas e fétidas
do mijo da madrugada.

Sua filha continua
se molhando durante a noite.

Não quer saber.
  Mãe vai comer.
Sem fome  estômago esfria.
Olhos amolecidos
soneira do meio dia

Encabulada a tarde chega
mansa, desfolhada

Filha ajuda mãe se organizar
Bolsa à mão
Sempre saindo
Camisão

Sonhos...
Borboletas azuis
Aguardam quietas
O retorno ao lar.

Poema extraído de” Santos de Quarentena”/Iris Tavares
Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - POÉTICA À OPERÁRIA


POÉTICA  À  OPERÁRIA

Faltou o beijo
na hora da chegada
línguas derramadas
antes que a porta se abra
um beijo e mais nada.

Conversas atropeladas
sobejos matinais
tempestade em copo d'água
sem que seja pedido
um beijo nunca é demais

Essa mulher que se emburrece
                   à toa
porque lhe foge a poesia
             é operária
tem a vida por um fio
bico de passarinho
rendas na braguilha

Mulher que chega do trabalho
tem suas rabujes, descrença,
predestinada a ser doméstica
avental aos pés da cama
quase tudo em nome dessa fulana
                um beijo
                um sorriso
                se não a boca carrapicho!

Que se dane essa azia
se queime essa agonia
suspenda a conta
não pague a padaria
precisa-se de fermento
em lugar da seda
               do colar
               dos brincos
               dos cristais

Lábios apertados
coração beira mundo
um pedido quase em prece
com fervor...

Um beijo
Um aperto
Um suspiro e seus ais...

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
 Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - CONFISSÃO


CONFISSÃO

Não houve tempo
entrelaçar as mãos
começo de manhã
fantasias vãs
Mulher vadia
afoga-se na panela
entre batatas e verduras
carne frita

Não queria esse papo
política, carestia,
mas o açougueiro é bravo
corpo respingado, sangria
Diz-se boi
a reclamar do curral
e não tem aparência de noivo,
'homem enamorado'

Não queria esse papo
intriga da sociedade
seus babados
o homem da carne que me perdoe
votar sem criatividade
é mal estar por longos anos
servidão

Insisto! Não queria esse papo
Filhos meus: por que esse atraso?
Que volte a madrugada
o dia se chegue mais terno, apaixonado
Lá fora é pasto
      Preciso sair do ninho?
Bicos emendados, cantos entoados
que me chegue assim a vida
Só os dias – alimentar o gado
'never'

Venha a relva e não o pasto
filhos meus, dos outros
e do mundo.

Poema extraído de “ Santos de Quarentena”/Iris Tavares, 
Fortaleza, Expressão, 1992.

POEMA - ALERTA




ALERTA

É preciso que haja
mais meiguice
mais compreensão
mais emoção

É preciso que haja
mais natureza
Coração sem medo
de guerrilhar
e conquistar
o que de direito
nos pertence.

É preciso que haja
humildade e consciência
nos jovens
nos velhos
nas crianças
nos amantes
Flores nos ideais.

É preciso que haja
mais mulheres na luta
no amor
na entrega
não somente a do corpo
a cabeça é que conta

Chega de arestas
frases incompletas
'Mulheres, precisamos conspirar'!
Por um país
feito de homens
fardões e camisolas
milhares de 'fulanas'
operários
sabichonas

Mulheres, precisamos acordar!!!

Poema extraído de “Santos de Quarentena”/Iris Tavares
Fortaleza, Expressão, 1992.